Considerando que resiliência é a nossa capacidade de enfrentar adversidades, assim como nossa habilidade de gerenciar e se adaptar aos novos desafios, a pergunta é se temos os recursos necessários para o enfrentamento, se dispomos dos recursos internos (psicológicos) e externos (ambientais) para nos recuperarmos diante do estresse que vivemos neste momento.
Muitas vezes nos sentimos tristes, sem forças para continuar, angustiados, deprimidos. Durante este período de pandemia sentir tudo isto faz parte, às vezes mais ou menos intensamente e essas sensações podem perdurar por mais tempo ou se agravam numa situação adversa. Pode ser depressão, que é caracterizada pelo humor deprimido, perda de interesse pelas atividades do cotidiano, energia reduzida, angústia, vazio, desânimo, podendo levar a perda de apetite e insônia. Por isso, é importante ter um diagnóstico, sem estigmatizar a doença e buscar profissionais qualificados para tratamento.
Agora, pensar resiliência para enfrentar nossas angústias é um bom começo. Lançar-se para encontrar recursos para recuperar-se do “rebaixamento” do humor, da falta de concentração, cansaço, tristeza, é de fato iniciar o exercício da resiliência.
Pesquisas mostram que os índices de depressão têm aumentado diante das circunstâncias atuais, parte porque tivemos queda na disponibilidade dos serviços que cuidam da saúde mental, parte porque as pessoas deixaram suas habituais consultas e tratamentos, e parte porque todos estamos lidando com situações muito novas, o medo, um vírus desconhecido, o isolamento social, a morte. As causas que levam a depressão podem estar associadas, segundo pesquisas, a fatores genéticos (probabilidade de 40%) e ao ambiente, ao contexto de vida. Então diante disto a pergunta é o que fazemos com estes dados? Como reagimos? Como analisamos as causas que nos deixam deprimidos e o que fazemos para sair deste estado? É fácil cair na síndrome de Gabriela, personagem de Jorge Amado que resultou na música “eu nasci assim, eu cresci assim, Gabrieelaa... Pensar nisso é determinar: “nada pode ser mudado.”
Por isso, questionar quais são os nossos recursos internos, nossas fortalezas, aquelas atitudes que sempre nos ajudam, que ressaltam o que é único em nós, somando os recursos do ambiente é um caminho para enfrentar este difícil processo chamado pandemia. Li num post de convite a um Congresso de Psicodrama que dizia “Não nascemos com problemas, não precisamos viver com eles, e nem morrer por eles.”
No meu trabalho como Psicóloga e Executive Coach, tenho atendido pessoas que apresentam depressão, ansiedade e estresse ligado ao trabalho. Muitas vezes a falta de sentido na vida laboral, ou contradições como trabalho demasiado x necessidade x qualidade de vida, exploração x esforço, carreira x qualidade de vida x grana, aprendizagem x tempo em uma empresa, sucesso x redes sociais, ser x ter, entre outras, são algumas ambivalências que levam as pessoas a sentirem-se perdidas, sem rumo, tristes, deprimidas. Essas questões podem ter emergido mais duramente na pandemia como algo que bate à porta e não quer se calar, e ruminam nosso pensamento.
Outro aspecto do que estamos vivendo é a tendência de achar que o passado era mil maravilhas, esquecemos rapidamente os nossos problemas anteriores. Então pergunto: o que mudou mesmo? Sinto-me realmente angustiado, deprimido, ou entrei na histeria coletiva? Nos contagiamos pelos outros e criamos necessidades que não nos levam a nada e que não são nossas. Novamente, será que não temos os recursos pra enfrentar?
Portanto, avalie o que é real ou não. Por exemplo, as pessoas se queixam que não podem se reunir com amigos, mas antes da pandemia pouco se encontravam. Outros quando trabalhavam presencialmente nas empresas pouco cultivavam relacionamentos prósperos ou até fugiam postergando o enfrentamento. Outros claro, tinham uma vida bastante agitada, um ambiente laboral produtivo, mas é possível encontrar novas formas das coisas serem feitas, antes dadas desculpas como a falta de tempo. Então avalie quais são seus recursos internos e o que tem à disposição. Talvez precisamos é aprender a usá-los melhor.
Sem dúvida, cansamos da atual rotina, máscara, álcool, isolamento social, e nos sentimos tolhidos. Escuto as pessoas confessarem “não tô aguentando”, outras apesar disso, me contam que encontraram prazeres e aprenderam com novas coisas, que o trabalho home office é mais produtivo, mais rápido, mais focado. Algumas relações familiares inclusive melhoraram.
Nesta trajetória culpar a pandemia por todos os males não acredito que seja um bom caminho e cuidado, não é a vacina que trará as respostas para todas essas questões. A essência está no sentido, em nosso caminhar. Culpar a pandemia é nos levar a letargia, a estados deprimentes. Veja quais são suas questões, cuide delas, busque os “recursos” para serem resolvidas. A pandemia também nos permitiu repensar nosso estado de ser, questionar nossas vidas, nossas ações, nossos objetivos.
Sem dúvida viver tantas ambivalências chega a ser tortuoso. Não ter respostas para o desconhecido nos leva ao estado de exaustão. Não duvide, ser resiliente também é dizer não sei, não consigo, preciso de ajuda inclusive de um profissional. Lembrando, resiliência é um processo de negociação, de gestão do desafio e adaptação diante de um risco ou adversidade significativa. Buscar ajuda faz parte do repertório de todo resiliente.
Como diz a nossa poeta Cecília Meireles:
Ou se tem chuva e não se tem sol,
ou se tem sol e não se tem chuva!
Quem sobe nos ares não fica no chão,
Quem fica no chão não sobe nos ares...
É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo em dois lugares!...
Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo...
e vivo escolhendo o dia inteiro!...
Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.
Portanto, some, exclua, inclua, use E, fazendo conexões e não apenas OU. Não se coloque em ambivalências desnecessárias.